Estive fora, de férias, por algumas semanas. Ainda com acesso intermitente à internet, vou tentar reunir num único post os acontecimentos das últimas duas ou três semanas que chegaram ao meu conhecimento a alguns milhares de quilômetros daqui e que ainda merecem comentários.
Uma fonte insuspeita -- um tricolor via DDI, para ser exato -- contou-me que o Flamengo foi escandalosamente garfado no sábado de Carnaval e que, por conta disso, o time do subúrbio sagrou-se campeão da Taça Guanabara. Fosse apenas um gol rubro-negro mal anulado -- e parece não haver dúvidas de que foi pessimamente anulado --, eu talvez creditasse o título vascaíno a um infeliz erro de arbitragem. Mas um outro lance, e uma outra trapalhada de Sua Excelência, o árbitro, deixou o meu amigo tricolor com a pulga atrás da orelha.
Lá pelas tantas, conta-se que o Jorginho deu um carrinho dentro da área rubro-negra, para afastar a bola. Vinha um vascaíno a meio quilômetro de distância e, vendo aquilo, o árbitro apitou jogo perigoso. Dentro da área do Flamengo. Dizem que o Wright, comentando o jogo, parecia genuinamente escandalizado com a decisão do juiz, cujo nome e cujos cornos aliás ignoro.
O curioso é, depois de acontecerem coisas assim, ver os vascaínos com aquele ar de dignidade ofendida sustentando a mesma conversa para boi dormir segundo a qual o time do subúrbio é sempre o injustiçado, sempre o perseguido, sempre o mais sacaneado -- talvez por ser o time do subúrbio, talvez por seu ilibado Presidente julgar-se inimigo figadal do Sr. Roberto Marinho, talvez porque sejamos um país mais racista que a África do Sul e nossas elites filohitleristas jamais perdoaram o Vasco por ter escalado uns pretos e mulatos em 1920, talvez porque círculos lacerdistas infiltrados até hoje em todos os centros decisórios do país jamais engoliram os comícios de Vargas em São Januário, na década de 40.
Eu, alheio a essas especulações sobre o verdadeiro motivo por que o Vasco da Gama é tão sacaneado, fico a relembrar as vezes em que foi, antes pelo contrário, muito beneficiado por decisões no mínimo duvidosas da arbitragem ou da cartolagem. Freqüentemente em cima do Flamengo. Como no sábado de Carnaval. Como nos 2 x 1 do Brasileiro de 2002. Como no gol anulado de Juan (ou terá sido do Beto?) na final do Carioca de 1999. Como no pênalti não marcado em cima do Romário na final da Taça Rio de 1999 (na ocasião, o então vascaíno Felipe quase pisou na cabeça do então rubro-negro Romário). Como no gol rubro-negro mal anulado na final da Taça Guanabara de 1998. Isso para não falar em casos que não envolveram o Flamengo, como a final do Brasileiro de 1974 (Jorginho Carvoeiro? Alguém lembra?), o mui controvertido empate com o Curintcha em 1989, que ajudou a levar o Vasco à final do Brasileiro daquele ano, a escalação de Edmundo na final do Brasileiro de 1997, a sacanagem a que submeteram o São Caetano em 2000, com a qual concordou um cartola são-caetanense, digamos assim, demasiado facilmente intimidável.
Diante disso, os poucos torcedores do Vasco com quem convivo vêm dizer-me que não houve falta sobre o Petkovic em 2001 (façam-me o favor, vejam o VT!). Ou desencavam a história do ladrilheiro. Serão realmente débeis-mentais de babar na gravata ou eu é que não enxergo que uma molecagem como a do ladrilheiro e um padrão tão consistente de arbitragens duvidosas são, no fundo, a mesmíssima coisa?
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Na minha volta, disseram-me também que o Pet vai jogar na China e que, muito provavelmente, eu jamais o verei vestir aquele trapo imundo outra vez. Menos mal. Acho que, desde o affaire Bebeto, ninguém mais considera um traidor o sujeito que, um belo dia, resolve vestir a camisa do maior rival. Mas o Pet foi, depois do Zicão, o jogador que eu mais gostei de ver vestindo a Camisa 10 da Gávea. E era chato, muito chato vê-lo com aquela camisa asquerosa sem cor nem glória, com um cinto de segurança no peito em vez da estrela amarela de campeão do mundo.
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Falar no Zico, o Galinho merecia uma homenagem muito maior do que a que posso prestar-lhe agora, quatro dias depois do seu cinqüentenário, e já meio sem clima.
O Zico foi o único jogador que me fez chorar duas vezes. Quando deixou o Flamengo em 1983 e quando deixou o Flamengo em 1990. O Zico me fez campeão do mundo, o Zico ajudou a fazer a cachorrada enfiar onde melhor lhe aprouve (à cachorrada) aquela faixinha ridídula que levava ao Maraca desde 1972, o Zico fez freguês ressentido do Flamengo o detestável Galo das Alterosas, o Zico botou aquela bola na cabeça do Rondinelli inaugurando uma era de predomínio absoluto do melhor time que já vi jogar, o Zico botou aquela bola no gol dos chilenos escrotos do Cobreloa, o Zico acabou com a vantagem do Santos do delinqüente do Serginho Chulapa em 40 segundos de jogo, o Zico botou aquela bola no gol do Santa Cruz e levou o Flamengo às finais e ao tetra em 1987.
Até hoje, quando Sua Majestade pisa na tribuna de honra do Maracanã, eu fico com os olhos verdadeiramente embaciados quando grito que “o Zico é o nosso Rei”. Ou quando escuto que “é falta na entrada da área / adivinha quem vai bater?”.
Quando o Zico fez aquele gol contra a Iugoslávia, em 1986, o Luciano do Valle disse que não havia palavras para descrever a obra-prima. Pois no cinqüentenário do Galinho, acho que todos nos sentimos um pouco assim, sem palavras para agradecer-lhe por tudo.
Mas todos nós tentamos: muito obrigado, Zicão.
7 de mar. de 2003
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