6 de jun. de 2004

AS LIÇÕES DO SR. MENDES JUNIOR





Um dos motivos pelos quais sou grato aos Rolling Stones é por terem popularizado o adágio it’s the singer, not the song. Eu o uso constantemente para explicar as causas de meu mal-estar quando ouço coisas sensatas pronunciadas por um cretino.

Digo isso a propósito das muito mal traçadas linhas do senhor Leonardo Mendes Junior no Blog de Primeira. Naquele escrito, o palpiteiro paranaense defende a demolição do Maracanã -- proposta com a qual evidentemente não concordo -- porque isso ajudaria o torcedor carioca a acordar para a realidade dolorosa da decadência de seu futebol -- constatação que subscrevo sem maiores dramas de consciência.

Dito isso, como responder ao escrevinhador de pasquim de província? Simplesmente jogar na cara dele uma lista de estrelas cariocas de outrora, de Leônidas da Silva a Romário, seria fugir do ponto principal: sim, o futebol carioca foi grande, e até o sr. Mendes Júnior concorda -- a contragosto -- com isso. Mas um Garrincha entortando joões em 1958 não apaga a triste realidade de um Douglas Silva dando patadas na bola em 2004.

Cotejar essa lista com uma que vá de Sicupira a Kléberson, passando por Rafael e Paulo Rink, seria covardia e deselegância. Colocaria o sr. Mendes Junior em seu devido lugar, mas seria deselegante.

Mas há um fato significativo por trás desse contraste entre Zico e Kléberson, um fato que devia ofuscar pela evidência aqueles que pensam o futebol brasileiro: quando o futebol carioca foi grande, o futebol brasileiro foi imenso. Tempos de Leônidas, de Barbosa, de Dida, de Garrincha, Gérson, Zico, Bebeto e Romário. Quando os paranaenses figuram na primeira linha do futebol nacional, é porque o esporte vai mal das pernas: tempos de Rafael e Lela eram também tempos de Márcio Nunes e Lulinha; tempos de Kléberson e Cocito eram tempos de Adãozinho e Magrão; tempos de Coritiba na Libertadores são tempos de Dimba artilheiro do Brasil.

Afinal de contas, quando foi, em um século de história, que os clubes paranaenses foram grandes merdas em nosso futebol? Foi durante a sangria de talentos de meados dos anos 80 -- quando Zico, Falcão, Sócrates, Dinamite, Júnior, Edinho, Careca e até gente do quilate do Casagrande estava ou jogando na Europa ou de malas prontas para ir para lá. Foi de 1999 para cá, quando a crescente debilidade da moeda nacional acabou com a farra dos grandes clubes que até então vinham repatriando talentos, postergando a saída de jovens craques e até importando estrelas de segundo escalão, como Petkovic e Asprilla -- a Brahma, a ISL, a Hicks & Muse, o Bank of America pagavam a conta.

Corolário óbvio: Atlético Paranaense e Coritiba -- assim como Bangu e São Caetano -- só podem aspirar a coisas grandes num futebol nivelado por baixo. Atlético Paranaense campeão do Brasil não é tanto o efeito do trabalho de um Petraglia, mas sobretudo o resultado de gestões imprevidentes como Kléber Leite, Edmundo dos Santos Silva, Eurico Miranda, Mustafá Contursi e Alberto Dualib.

Por que insisto em buscar causas do sucesso relativo dos paranaenses quando o assunto é a decadência inegável do futebol carioca? Porque o sr. Mendes Junior caga regras olhando de cima, como que dando lições aos imbecis que teimam em cantar refrões de tempos idos no Maracanã em vez de assistir a Pato Branco x Matsubara no pay-per-view. Acredita sinceramente que está em condições de nos ensinar a gerir nosso futebol porque não enxerga que o Atlético Paranaense e o Coritiba só podem parecer grandes num cenário de débâcle de quase todos os clubes verdadeiramente grandes.

Que os clubes cariocas mereciam administrações melhorzinhas é uma conclusão inescapável para quem quer -- de verdade, e não da boca para fora -- vê-los fora do atoleiro em que se meteram. Reconhecer isso está longe de subscrever as teses que gente do quilate do sr. Petraglia quer empurrar-nos goela abaixo como receitas para o sucesso.

Claro, o pensamento do sr. Petraglia tem pelo menos coerência interna: ele prega um futebol sem pobres nas gerais porque sabe que matar a paixão é a receita para um time do Paraná disputar espaço com os grandes. O sr. Mendes Junior não enxerga as conseqüências últimas dessas teses modernosas: vem cagar regra porque acredita sinceramente que, se o Atlético se sagra campeão do Brasil, é porque o futebol do Paraná é uma fortaleza.






2 comentários:

Freire disse...

Grande Tinhorão. Estamos aí. Espero que consiga mudar o sistema de comentários para o Haloscan. Esse esquema é horrível. Abraço.

Oswaldo Tinhorão disse...

Renato, você sabe que eu sou meio analfabeto com esse negócio de blog. Vou pedir a alguém que entenda para me ensinar o caminho das pedras. Mas pior que os comentários do The Blog, acho difícil.