15 de mar. de 2010

TINHORÃO EDUCATIVO

Esta tarde, enquanto ouvia o Flamengo bater mais uma vez o Vasquinho, eu me perguntava, entre um bocejo e outro, se ainda posso ser relevante. A pergunta, se revela uma modéstia inesperada neste cronista, ao menos tem lá sua razão de ser. Estou, afinal de contas, afastado do Brasil há vários anos, com acesso irregular às cousas do Mais Querido, e neste tempo todo surgiu gente de muito talento para defender as nossas cores nestas trincheiras da Internet.

Mais: meus últimos escritos não trataram propriamente de futebol. Representaram, antes, minha pequena contribuição no que eu julgava ser a batalha mais meritória em que um rubro-negro podia engajar-se, àquela altura: expor às mazelas da administração Kléber Leite e, com isso, fazer a minha parte para ajudar a extirpar da Gávea o maior câncer a acometer o Flamengo, em 115 anos de história.

O fato de, poucos meses depois de chutarmos de lá esse pulha, termos alcançado o mais improvável de nossos títulos prova que alguma razão me assistia. Se minha pequena contribuição ajudou ou não são outros quinhentos. Eu até acho que, pela importância do veículo onde eu escrevia, pelo grande público que atinge, algum bem terá feito. Eram argumentos sólidos que, nas mãos certas, podem ter contribuído para pôr as coisas em perspectiva.

Mas passou-se um ano desde então, o sr. Kléber Leite foi escorraçado para, Deus esteja, nunca mais voltar, o Flamengo é hoje hexacampeão do Brasil e parece ter tomado gosto de se medir com os inimigos que nos convém cultivar: a paulistada ignóbil, a freguesia recalcada de outras comarcas caipiras e, agora sim, os rivais latino-americanos, contra quem ainda temos muitas contas para acertar. Essa retomada da missão histórica do Flamengo parece ser comprovada, com sobras, com o choro do vascaíno que destaco para vosso deleite (ver o comentário n° 5).

Pois muito bem: em um ano as coisas mudaram para muito melhor, e há rubro-negros dos melhores, na Internet, esfregando a nossa grandeza irritante nos cornos da freguesia. Diante disso, tem alguma valia eu continuar a dar meus pitacos?

Pois eu suspeito que tem, pelo seguinte: eu tive a glória de estar no Maracanã na tarde de 6 de dezembro de 2009, e o que eu lá vi me emocionou em mais de um sentido. Não só pelo título que aguardávamos há dezessete anos, mas por tropeçar, a cada passo que dava, em pencas de rubro-negros que tinham menos de dezessete anos. Gente para quem um Júnior pulando feito criança, depois de decretar o Penta, há de ser uma referência quase tão distante quanto é, para mim, a de um Valido febril decretando um tri em cima das costas de um Argemiro.

Fato é que, naquela tarde memorável no Maracanã, eu de repente me senti velho. Nos meses que se seguiram, acompanhei, à distância, os debates que se instalaram sobre o nosso Hexa, e me dei conta de como grande parte dos inimigos também é composta de moleques. Moleques que cresceram sob a influência perniciosa da mídia paulista, que repetem as babaquices que aprenderam com um Milton Neves, um Neto, um Godoy, e que não têm a mais remota idéia de como eram as coisas antes desse hiato de dezessete anos.

E me dei conta de que, se alguma função meus escritos ainda podem ter, há de ser uma função educativa. Educativa para os nossos, que cresceram achando normal aspirar a, no máximo, um carioquinha em cima de Botafogo ou Vasco, e educativa para os outros, que repetem impunemente as bobagens que ouvem dos caipiras ascendidos a formadores de opinião.

Se o Flamengo de fato voltou às grandes ligas, nossa torcida precisa ajustar suas expectativas a essa realidade, abandonar os maus hábitos adquiridos em dezessete anos e ter sempre em vista o tamanho que o Flamengo pode ter. Graças a Deus não estou sozinho nessa empreitada. A bendita faixa que sentenciava que “o Brasileiro é obrigação” bem demonstra que quem viu o Flamengo grande não está disposto a deixar a molecada esquecer.

De modo que estou muito bem acompanhado nesta função de educador. E, se algo de novo eu posso trazer, há de ser uma intransigência incomum ao lidar com quem, hoje, é o nosso maior inimigo: a paulistada recalcada (tricoloucas sobretudo), que passou dezessete anos tripudiando do Flamengo mas, com um título apenas do Mais Querido, volta a encarar-nos com pânico.

Sinal de que toda a auto-estima que construíram, em dezessete anos, não é capaz de resistir ao menor triunfo rubro-negro.

2 comentários:

Freire disse...

Excelente, Tinhorão. Escreva com mais frequência, mesmo longe. Ainda visito teu blog para reler posts de 2003 (tempo passa rápido). Abraço!

ZicoRei disse...

Foda esse texto. Melhor que li em muito tempo!
Parabéns!