26 de abr. de 2010

RECORDAÇÕES DE OUTRO FLAMENGO x CURÍNTIA

O ano era 1991, e o abominável Sport Club Curíntia Paulista iniciava sua epopéia de não conquistar a Libertadores da América. Houve outra tentativa antes, suponho, em 1977, em razão do vice-campeonato brasileiro de 1976, mas foi a partir de 1991 que a presença do Curíntia no torneio continental se tornou mais freqüente e, por conseguinte, mais gratificante. A partir de 1991, a incolor agremiação interiorana se fodeu de preto e branco em 1995, 1996, 1999, 2000, 2003 e 2006.

E se fodeu em 1991.

Como mandava o regulamento dos bons tempos, os dois (e não mais que dois) representantes brasileiros, Flamengo e Curíntia, caíram no mesmo grupo 3, junto com os uruguaios Nacional e Bella Vista.

O detestável Curíntia vinha de ganhar o campeonato brasileiro em 1990, numa campanha em que seus principais jogadores foram o gordo escroto Neto e o juiz escalado para beneficiá-lo a cada rodada. (Em 4 de outubro de 1990, um juizinho de nome Edson garfou escandalosamente o Flamengo, em pleno Maracanã, num jogo que os do arraial venceram por 2 x 1; nas semi-finais, contra o Bahia, um tal Joaquim foi ainda mais desavergonhado, chegando a apitar lateral quando um atacante tricolor avançava livre pela ponta direita, com a bola uns dois metros para aquém da risca lateral.)

Pois Flamengo e Curíntia voltavam a duelar pela Libertadores da América de 1991. Estreamos com um empate meio chocho, 1 x 1, contra os arraialinos, numa partida disputada em Cuiabá por conta das reformas no Maracanã. Daí em diante o Flamengo empatou com o Bella Vista, em Montevidéu (2 x 2), e ganhou do ainda respeitável Nacional em pleno Centenário (1 x 0). O Curíntia conseguiu dois empatezinhos sem-vergonha contra os mesmos adversários, ambos por 1 x 1, ambos fora de casa.

A 20 de março de 1991, o Mais Querido do Brasil ia ao arraial de São Paulo de Piratininga enfrentar o mais querido da província, no Pacaembu. Do nosso lado estreava o goleiro Gilmar Rinaldi, que formava a defesa com Aílton, Adílson, o becão Rogério (hoje nosso técnico) e Piá; um meio-campo respeitabilíssimo com Charles Guerreiro, o Maestro Júnior e a dupla Marquinhos e Marcelinho; no ataque, Alcindo fazia dupla com o artilheiro Gaúcho, mas houve espaço para que jogassem, no segundo tempo, as jovens promessas Paulo Nunes e Nélio, o mais rubro-negro de todos os atletas rubro-negros.

O Curíntia vinha com a escalação habitual de Ronaldos, Marcelos, Tupãs, Netos e merdas quejandas.

O jogo nem era, em si, tão decisivo, eis que tanto Flamengo como Curíntia voltariam a enfrentar os uruguaios em casa, num torneio em que se classificavam os três primeiros. Mas a neurótica torcida corintiana estava de mau humor e pronunciava ultimatos contra o time: contra o Flamengo, não se admitia outro resultado que não a vitória. O clima no acanhado Pacaembu era tenso, de decisão.

Mas o Flamengo, onde começava a estruturar-se o time pentacampeão de 1992, não tomou conhecimento das neuroses corintianas, e soube, com muita tranqüilidade, transformar em gols (Rogério e Gaúcho) a sua flagrante superioridade sobre a overrated mulambada corintiana. Feito o segundo gol, a mediana torcida do Curíntia perdeu a paciência e fez o que se espera dela: barraco. Começaram a chover garrafas em campo, numa época em que já não se vendia bebida em garrafa em estádio, e logo vieram as ameaças de invasão. O apitador apitou o fim do jogo e deu por vencedor o Flamengo, que voltou para o Rio com os dois pontos.

(Coisa muito parecida com o que se veria, em 2006, quando o River Plate não tomou conhecimento de Tévez & cia. e soube impor-se à paulistada asquerosa em pleno Pacaembu.)

Ambos os times prosseguiram na Copa. O Flamengo bateu o inofensivo Deportivo Táchira nas oitavas (3 x 2 na Venezuela, 5 x 0 no Maraca) e depois acabou eliminado pelo Boca Juniors nas quartas (2 x 1 para nós no Maraca, 3 x 0 para eles na Bombonera, com participação especial do juiz uruguaio Ernesto Filippi). O mesmo Boca eliminara o Curíntia nas oitavas, 3 x 1 em Buenos Aires, 1 x 1 no arraial.

Na quarta-feira Flamengo e Curíntia voltam a encontrar-se, pela primeira vez, pela Libertadores. Hoje quem anda de mau humor com o time somos nós, e com alguma razão. Não pela perda do Torneio Início, sublinhe-se, mas pelo futebol pífio que o time anda apresentando (e, no caso deste cronista, pelas palhaçadas extra-campo protagonizadas por dona Patrícia Amorim, que demitiu Andrade pelas razões erradas e foi de uma burrice atroz no episódio da Taça de Bolinhas).

Apesar de tudo isso, apesar do futebol ruim e da presidenta pior, faço fé na vitória rubro-negra. Acredito que vencemos, porque o elenco precisa dar alguma satisfação à torcida, depois dos tropeços recentes. Desambientado sempre que jogou no estrangeiro, este ano, o Flamengo tem no Curíntia -- freguês doméstico e velho conhecido -- um adversário ideal para demonstrar que não esqueceu o futebol que vinha jogando, desde a arrancada ao Hexa até mais ou menos o Fla-Flu do carioquinha.

E eu cá suspeito que, no Curíntia, a tranqüilidade de quem fez a melhor campanha é apenas aparente. Não ter a Libertadores, para essa corja, é uma capitis diminutio maxima, diante das glórias já alcançadas pelo Santos, o São Paulo e o Palmeiras (e pelo Flamengo, que é tudo o que eles querem ser quando crescerem).

No Maraca lotado, cada corintiano há de se lembrar dessa sua carência. E perceberão que ganhar a Libertadores não é tarefa simples. Não é para qualquer Curíntia.

Vai pra cima deles, Mengo.